NESTE PONTO O FICHEIRO POESIA
MILITANTE TINHA 95 PÁGINAS E 7054 PALAVRAS, VOU CONTINUAR…!
LIVRE E DIFERENTE
E por fim
Cansado
De tudo de ti para min
Conservar
Verifico com alegria e tristeza
Num mesmo espaço-tempo
Que teu destino
Como
o infinito
É ser isso mesmo
Albergar
tudo
O
bem e o mal
Infinitamente grande
A sempre prometer
Mas nunca se dar
Para
ser livre e diferente!
Reis Caçote
1990/14
FICAR, JAMAIS
Faço um esforço sobre humano
Para conservar dentro dos meus
Os olhos teus.
O teu breve e invulgar sorriso.
O sentir perto teu calmo gesto
Onda fresca e salgada de mar
À areia ainda fresca e húmida chegar
A abalar a
chegar a abalar
Sempre assim~
A chegar a abalar
Como temos feito sempre:
Chegar-abalar
Vir-partir
Ficar é que nunca
Como
o Mar
Reis Caçote
1970/14
PERGUNTAS AO CRIADOR
Desde há anos vários que ando a adiar
Ter contigo esta conversa sã
Ainda que a esperança seja vã
De te ver acordar e dialogar.
Mas esse teu sorriso de ironia
Mantém-se exactamente igual
Desde “aquele dia “a este dia!
Um sorriso de satisfação e prazer
É o que me recuso a ver.
É que se fizeste o que tantos afirmam
O mundo e tudo o que contém
Há uma quantidade de anos
Não sei bem
Ou não foste tão rigoroso quanto dizem
Ou então
Terás de compreender
A minha incompreensão e
Por que não
A minha critica à tua obra
E ao teu sorriso gozão!
Terás mesmo feito o homem à tua imagem
Ou será mera desculpa dos actuais construtores?
É que alguns deles e não deixarás de me dar razão
Saíram uns bons estupores!
Acredito
que ao fim de seis dias de trabalho
Fosse
evidente teu cansaço
Já
que nesse espaço d tempo eu faço
Bem
menos e de certeza pior
Mas
não o dou por acabado!
E lá estou no dia seguinte sem enfado
Para o continuar e
Muitas vezes aperfeiçoar!
Tu não!
Construíres tudo o que por aí vai
E ao sétimo dia descansares
Irás desculpar mas é dares-te
Uns certos ares… e sobretudo
Demasiado confiares!
E a porcaria que seria de esperar
Aí está
Em tudo o que é vergonha
Em tudo o que é explorar!
Terás sido tu porventura
Quem deixou dito e escrito
Que o Norte exploraria o Sul
E que o branco seria dos outros patrão
Durante séculos de escravidão
E que hoje ainda aí está
Dito que está erradicada
Só que feita de forma mais descarada
Mais desenfreada
Logo mais desesperada!
Que nada tens a ver com tanta contradição
Terá sido de outros e muito mais tarde
A criação de tanta aberração!
E terás sido tu quem entendeu
Que minha companheira não seria como eu?
E porquê, explica, se de ti partiu a decisão?
Irei ficar sem resposta? Espero bem que não!
Estavas só do que se sabe
Mas tal nem tudo resolve
E muito menos absolve!
É que ter o atrevimento
De sozinho fazer tudo
É quase certo e sabido
Que a maior parte do que fizeste
Em seis dias
Tinha de dar num enorme caso bicudo!
E
está a sê-lo!
E
cá vou fazendo meu juízo…
E estranhando teu irónico sorriso!
Reis Caçote, 1990/7
VIVER SEMPRE
Viver sempre também cansa
O escreveu José Gomes Ferreira
Amigo meu!
Sobretudo viver muito e mal
Só assim o entendo eu.
Aquele amigo e parente de Leiria que insiste
Em implicar com o provérbio
“Que
deus dá o frio conforme a roupa”
Teima que para não parecer um vazio
Deus
devia dar a roupa conforme o frio
Tem uma lógica demasiado fria
Que não se resolve com poesia!
E não tem apenas lógica…
Tem ou não alguma razão.
Reis Caçote
MG27/6/90/14
QUANTO EU QUIZ
Não seria alguma vez capaz de avaliar
O quanto eu quis dedicar-te esta noite
Aquela noite e todas as noites.
O quanto eu quis dedicar-te cada dia
Não os dias todos juntos
Um dia de cada vez
Um dia diferente cada dia
O quanto eu quis fazer para ti
Neste dia que passa e no que está para vir
Sobretudo e apenas para te saber feliz
E te ver sorrir.
O quanto eu quis
O quanto eu quero é
A certeza que não tenho
E o que me faz infeliz!
Reis Caçote
04/07/90
TUDO NORMAL
Dias há que de boa vontade
Suprimiria
De meu calendário de vida.
Nem o Sol surgiria
Assim como não houvesse chuva ou nevoeiro.
Apenas consentiria
Para contentamento geral
O boletim meteorológico
No último telejornal.
E ouvir o meteorologista dizer
Naquele seu ar informal:
Hoje
Senhores
telespectadores
Em
termos meteorológicos
Nada
sucedeu
Tudo
foi normal!
OCASO
De algum modo cansado no
Desgastar das férias entre paredes e calor
Delas reflectido
Decidi que ao menos um dia
A tua despedida assistir iria
E já pelo fim da tarde
De um dia qualquer
Dirigi-me para a beira-mar e esperei
Decididamente
Que esse teu vigor incandescente
Ao se aproximar
Lá ao longe do mar
Arrefecesse e mudasse de côr
De amarelo a vermelho
E aos pouco
Lentamente
Acabar por se afogar!
Reis Caçote
16/09/70
TALVEZ NÃO
E o sábado trouxe de mansinho
Pela mão
Este Setembro
De cinzas vestido
Que entrou e se instalou
Com todo o ar de definitivo e
Sem autorização se fixou.
Na caixa de sons afectivos
A que insistem em chamar
E por que não?
De coração!
É o fim do Verão
Quente
Mesmo escaldante
Ou talvez não?
Ou
talvez não!
Reis Caçote
01/09/90
HÁ QUEM DIGA
Dilui-se na distância do mar
Esta linda mas ténue ilusão
De que em Agosto se calhar
Haveria calor e Verão!
Mas o que de facto houve
Custe ou não acreditar
Foi o aumentar da fronteira
Que sempre nos quis separar
Ou melhor dizendo
Sempre insistiu em não permitir
Nos juntar!
Mesmo de contornos pouco claros
Teve sempre poderes raros.
Há quem diga que é o destino
E que posso eu dizer
Se no destino insisto em não crer!?
Reis Caçote
02/09/90
SIMBIOSE
Ainda há pouco para me divertir
Sem testemunhas e sem método
Resolvi dois “quadros” destruir!
Bem, destruir, destruir seria desacato
O que sucedeu é que os parti a meio
Fazendo de dois, quatro.
E de seguida
Levado na onda da boa disposição
Que vinha desde o almoço
Onde havia só laranja passou a haver também
Preto branco e amarelo
Alterando uma estrutura para outra
Sem que o “quadro” ficasse mais belo.
É que bela e gostosa
Foi a companhia do almoço
E a dobrada
Que estava bem saborosa!
Reis Caçote
19/07/90
DÉCADA DE 60 – DESPONTAR DE TANTA FLOR NA SAVANA DA GURRA
COLONIAL
ESTRELAS
Estrela teimosa
Persistindo no suicídio
Por afogamento
Em cada noite que passa
E olho
Ali em baixo
Água parada
Em que procuro ver reflectidas
As rugas do meu pavor.
Que vem dos ramos sem andorinhas
E se agitam de frio
De lágrimas de estrelas
Sem lagos para o seu suicídio
De todas as noites.
O QUE TENHO
O que tenho?
Um domingo quase no fim do látego
Uns montes que me oprimem
Um aparelho tv mal funcionando
Um programa repetindo
Umas nuvens baixas negras de chuva
Um vento estropiado de trote de rio barrento
Um quadro meio queimado
De castanho mal pintado
Uma falta enorme de inspiração
Para a revolta!
Uma merda!
VINGANÇA
Incapaz de pensar
Para escrever
Escrevo
P’ra não pensar!
…vingança da incapacidade!
OS POETAS
Como eu admiro os poetas
Que conseguem ver uma flor
Onde
apenas vejo musgo
Que conseguem ver uma estrela
Onde
apenas vejo uma lágrima
Que conseguem ver um amplo sorriso
Onde
apenas vejo um esgar
Que conseguem ouvir um hino
Onde
apenas oiço soluços
Que conseguem ver límpidos contrastes
Onde
apenas vejo um borrão de cores esbatidas
Que conseguem ver um puro regato
Onde
apenas vejo uma torrente de lama!
Ah! Eles são os verdadeiros poetas
Eu
sou um complicativo.
Reis Caçote
DIFICIL SER
Difícil ser vagabundo
De sonhos verdes
De banco de jardim.
Só resta o musgo nos muros
E outro pretenso vagabundo
Ao pé de mim moribundo.
Como é difícil ser vagabundo!
EM BUSCA DE
Mais uma tarde inteira corri
Pela tempestade de poentes
De
doirar lágrimas
Na esperança de encontrar-te
Nua
Em qualquer parte
Verdade
Voltei já tarde
Pelos mesmos caminhos
De látego marginal
Procurando correr de cansaço
Atrás de mim próprio7
Com a ideia de continuar amanhã
Com os pés descalços
Sobre as papoilas de lábios cerrados
Descrentes como eu
De
encontrar-te
Em qualquer parte!
FARTEI-ME
Fartei-me de carregar este fardo
De bruma constante
Que dificulta o voo das andorinhas
De todas as primaveras
À procura de seu ninho inabitável
De musgo nas janelas
E frio.
Frio de grades de aranha
A passar pelos corredores do cansaço
Da tarde que não chegou ainda
Mas se avizinha
Com a tristeza do trevo à chuva…
INSULTO
Insulto matinal
De rafeiro de cauda erguida
No seu gesto natural
De levantar a pata traseira
E mijar
Displicente
No pedestal do busto
Do comendador!
MORRER EM PÉ
Não para que todos soubessem
Mas gostaria de não morrer como eles.
Gostava de morrer na rua
Numa explosão
E projectar no espaço de bruma
O que não consegui em vivo
Tudo o que bom possuía .
Gostava de morrer em pé!
ACUSAÇÃO
Continua a formar-se geada
No caminho de todas as cabras
No pasto de todos os vendavais
No recando de todas as fomes
Fomentadas.
Castigo frio para os que
Se cobrem com o Sol.
Os fabricantes dos cobertores dos outros.
Os que andam apressados pelos trilhos de todas as cobras
Cortados pelas lâminas de todos os nortes
Ameaçados com promessas de calor
Cansados…
Mas que a lua também beija.
SEREI TALVEZ
Serei talvez um marginal
Por não aceitar
A amorfa confusão
Da sociedade a que na superfície pertenço.
Fartei-me
De
amplos gestos
De
palavras rebuscadas
De
frases inconvenientes
De
alardes de heroísmo
De
revolucionários de café
Do
colorido artificial e inútil
Da
guerra dos jornais
De
futebol.
Não preciso disso para escrever.
NEM SÓ
Habitar sozinho
Esta raiz de orvalho
E espreitar pela manhã
A vida
Que se avizinha
Mo arrastar de pés cansados
Do dia anterior
E
Convidar esses seres
Para a refeição que não tiveram
E
Dizer-lhes que
Como os Senhores
Têm direito à vida
Pois nem só de trabalho
Vive o Homem.
OUVIR SEUS AIS
Gesto guilhotina a rasgar
O véu translúcido
Mal cobrindo a ignorância
Não aceite
Só por alguns desejada.
Tempestade de pântanos
Calada elo chicote
Do não saber
Apenas poder.
Campeões do silêncio
Da incerteza
Do medo
Do isolamento
Dos favores dos senhores
Da inconsciência permanente
Dos deveres
Dos direitos que não conhecem
Do dizer sim quando é não
Das palmas nas ruas
Das flores nas ruas
Para não serem sempre campeões do silêncio
Para lá do véu que rasguei
Com gesto guilhotina
Numa manhã de coragem
Para
ouvir seus Ais.
MOÇÃO
Vai ser posta à votação
Na magna assembleia
Uma moção:
Para criação
de um feriado
Que
distinguirá o jardineiro
Deste jardim
À beira-mar
plantado.
Se for “sim” haverá feriado
Se for não
- Poderá ser
não ?
Será exilado.
656.97309.152543851444034&type=1&relevant_count=1
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POESIA MILITANTE
FRIEZA
Dos
olhos daquela criança
Que
chora
Aparei
cristalinas
De
cada olho uma lágrima
Que
coloquei nos teus olhos de estátua
Insensibilidade
de pedra
Já que
nunca tinhas chorado:
Nem lágrimas de
criança se ajustam
Aos teus olhos!
Serão
de vidro?!
ORATÓRIO
Atrás
daquela janela
Está
acesa uma vela
Não alumia um
altar…!
Mas a
fotografia de um militar!
EMIGRAÇÃO
Para
terras de França partiu
Mais
um irmão…
Como
os outros clandestino
Analfabeto
como os outros.
Ficarei mais rico sempre que um irmão
parte?!
Não!
Como eles reneguei a herança
Mas nunca partirei para terras de
França.
Enquanto
em mim residir a esperança
Não a
apregoada na fé
Mas a
na falta de fé idealizada
Em cada dia
Apenas de poentes
Que só a natureza
Se
permite colorir!
DO
HERÓI
Meu
remo partido no lombo do mar
Meu
coto de braço perdido na guerra
Meu
resto de perna amputado de bomba
Meu
olho a menos perdido na mata
Meu
pensamento interrompido pela última explosão.
Coto de braço
Resto de perna
Olho a menos
Pensamento
interrompido
Meu
remo partido no lombo do mar
Sou o que
resta de um Herói da guerra!
em ser
operado!
A
partir daí
Nos
olhos e mãos do “ONU – NATO
Farto
de frio
Farto
de fome
Farto o frio de
fome
Farta a fome de
frio
Vietname
!Paquistão !Biafra !
Discussões
duras nas Brancas casas
Sobre a fome de frio farta
Sobre o frio de fome farto
Nas
Casas Brancas discute-se duro
Sobre as casas sem côr
Dos de fome fartos
de frio
Dos de frio fartos
de fome
A frio
se discute duro nas Casas Brancas
Alçapões
de consciências!
E do
alto da vestida sabedoria branca
Brotou
a negra sentença:
Tens de pensar em ser operado!
Passei
a ver só um bisturi!
Grande demais para amputar
Minhas
cordas vocais!
Mas
aqui para nós:
Se tiver que ser
operado
E gritar não for
capaz
Virei à mesma p’rá
rua
Com meu grito num
cartaz!
Sempre
que tiver razão
Lá
estarei de cartaz na mão
Calarem-me
é que não!
E se
meu grito
Não
couber num só cartaz
Gritarei
em dois
E se
preciso for escreverei,
Pela
frente e por trás!
E se
me cansar do cartaz
E
continuar a ter razão
Como agora
Olharei
para trás e
Num
repelão
Deitar-vos-ei
a língua de for !
Não
esperarei que m’a puxem
Nem
ouvirei vosso palavrório
Como
sucedeu naquele dia
No teu
consultório!...
GUIA “TURISTICO”
Vedes
além
Engravatado
Aquele
homem parado ?
Não é um
vadio
Um ocioso
É um
“senhor deputado “ !
A
atravessar a rua
Gordinho
De
charuto na boca
E
olhar sinistro?
Não é um
assassino
Nem um
cauteleiro
É um
post-ministro!
Daquele
lado
Com
duas moletas
Em
metal cromado?
Não teve
um acidente
Veio da
guerra
Era
soldado!
Lá em
cima
A meio
da encosta
A
luzir?
São
telhados de barracas
De gente
humilde
Para
demolir!
E
aquele todo sujo
De
andar lento
E
grande cifose?
Não é um
desempregado
É um
mineiro
De pulmão
silicose!
PRIMAVERA
Dia 21
de Março…
Levantei-me
cedo e fui acordar o Sol,
Tinha
a intenção de em seguida ir
Escrever
uma ode à Primavera !
Ruiu
pela base o plano ao recordar o
Abate
sistemático e organizado
De
qualquer tipo de árvores e no lugar delas
Acumular
toneladas de cimento e tijolos
Desequilibrando
o sistema anterior.
É
Primavera!... (e por aqui ficou o poema )
Agora vou para a rua construí-la!..
A CARA
DO ANGELO
Trazia
no rosto o rubor e a alegria
Dos
catorze anos incompletos
E da corrida
do atraso para o jantar.
-
Então que houve?!
Espontâneo!
Alegre!
Estivemos
a preparar uma insurreição!
- … !
Uma insurreição?!...!...!
Metemos
pregos e fósforos em todas as fechaduras
Do prédio
aqui ao lado!
Metemos
na estrada aqueles ramos de oliveira
Que foram
cortados há dias ao fundo da rua!
O
atraso foi maior por andarmos à procura de um policia
Para o
atropelarmos com as nossas bick !
Desculpa
lá o atraso, mas tinha de ser! …
Posso
ver o último telejornal?
…?!...
É só
para ver a cara do Ângelo!
INVASÃO
DO CIMENTO
Para
silenciarem o coaxar das rãs no charco
Construíram
de cimento um mausoléu
De
oito filas de “gavetas”
A
seguir à minha janela das traseiras
Roubando-me
Insensatos insensíveis
O
pomar
O rio
O Sol
A Lua
Mas eu
invento-os :
Com rãs no charco
E a espreitar
pelas janelas !
PROMESSA
Fica a
solene promessa
De
contar todas as estrelas
Assim
que desapareça a tristeza
Dos
olhos das crianças!
OFERTA
Dentro
em breve oferecer-te-ei
Naturalmente
Este
jardim
Com rosas
e pássaros coloridos
Poisados
dentro dos teus olhos!
NO
JARDIM PUBLICO
Esfreguei
com força
Uma, duas
três vezes osolhos.
Aquela
imagem mantinha-se ali
Quieta
Provocatoriamente
quieta
Ao Sol
fraco de fim de Setembro.
Sobre o banco do jardim
Lado a lado abraçados
Blusa e saia / casaco e
calça.
No
chão
Lado a
lado também
Dois
pares se sapatos
Um de tamanho e modelo para
homem
Outro de tamanho e modelo
para mulher.
Peça
escultórica de escola impressionista!?
- Num
jardim público?!
Aproximei-me
mais e entre as calças e a saia
Num
pequeno pedaço de papel “transparente “ li:
Subimos ao céu mas pouco demoramos
Conservai
nossos únicos bens!
FELIZES
Se às
estátuas que enfeitam os jardins
Onde
crescem as flores e árvores
E a miséria
Perguntassem
se eram felizes
Certamente
ouviriam e veriam como eu
Um não
plasmado nos seus lábios de musgo
E veriam
lágrimas a pingar nos lagos!
CALMOS
SONHOS
Belos
e calmos serão vossos sonhos
Prolongados
que são pelos profundos sonos
Quase intermináveis!
Eu mal
durmo
Com
cada vez maiores pesadelos!
Por
isso me levanto cedo
E com
vontade de me não deitar.
Prefiro
estar acordado… sempre…
Mesmo
na noite
Que
alguns querem artificiosamente aumentar!
Estar aqui fora ao Sol com
outros
Abrir novos espaços com
outros
Para
poisarem as pombas brancas que
Cansadas
Escorraçadas
Sobrevoam
todo o Mundo!...
DIA DE
NATAL
Seis
anos de idade…talvez
Um
metro de cidadão
Dentro
de um arremedo de camisa
E
dumas esburacadas calças
Que
mal chegavam aos pés nús
Frios
Como
esta manhã de 25 de Dezembro.
De peito côncavo
Esquivando-se ao frio
De mãos nos bolsos vazios
Fugindo ao frio
Olhava:
O outro menino à
sua frente parado.
Dirigiu-se
a ele
De
mãos frias nos bolsos vazios
Colocou
seu pé nú
Ao
lado da bota nova
Azul
Do
outro menino.
Espreitou
De um
e outro lado
Será que sorriu ?!
Parecendo
satisfeito com a análise.
Tirou uma das
sujas mãos do buraco-bolso
Coçou sua cabecita
suja num gesto-hábito
Dos sempre em
dificuldade,
E
correu passeio adiante
Com o
Natal nos olhos
Em
busca de umas botas azuis!...
Reis Caçote
1968
E SE…
E se
Um ministro do ultramar
De Salazar
Das guerras coloniais
Fala em paz e democracia
Isso
será demagogia?
E se
Quando dás uma moeda
Ao miúdo pedinte
E lhe recomendas que é para um bolo
Isso
não será o F.M.I.?!
E se
Um desconhecido
À mesa do café
Vinte paus na mão
Para uma bica de dez
Optando entre receber o troco
E o perder a camioneta
Resolveu pagar o teu café
Isso é
impulse ?!
II PARTE
TROVOADA
O dia
todo para lá do castelo
Fizeram-se
e desfizeram-se
Velos
de nuvens de lã branca
Que
subiam…subiam
Com
seus rostos deformados
E
enormes narizes.
O Sol,
farto daquele jogo de aparece-esconde
Desapareceu
de vez por detrás da orada do Anjo.
E a
avó Zéfa
Encolhida
na sua quase cegueira
Parecia
esperar pelos anos
E pelo
fim
Dentro
do seu xaile preto.
Baixo
e prolongado
O
primeiro arrastar dos móveis do céu
A
seguir à luz do grande fósforo lá fora riscado.
- Aí a
temos!
- Deus
te guie!
A luz
intensa e o ruído entraram atenuados
Pelos
filtros dos ouvidos e olhos da avó Zéfa
De rosário na mão
Segurando entre dois dedos
uma Ave-Maria segredada:
- Ave
Maria
Cheia de graça
(baixinho)
O Senhor é…
Luz intensa a iluminar tudo
Pelas frinchas da madeira da
porta e da janela
E pelos defeitos das telhas,
num telhado sem forro.
BUMMMMMM!
-
Santa Bárbara Bendita
Que no Céu estás inscrita
Com papel…
BUMMMMMMMMM!
- Ai
valha-nos Deus!
- … Em
papel e água benta…
E o
garoto calado
A
tentar entender tudo aquilo:
A Santa Bárbara lá em cima
Ao pé do campo da bola
Fechada numa capela sem
janelas
Todo o ano até Setembro!
BUMMMMMM!
E nova
faísca para lá do castelo
E a
Santa Bárbara todo o ano prisioneira
Protectora
das trovoadas
Nada
de atender à frágil súplica da avó Zéfa!
. Coitados dos que andam na lavoira!
- Deus queira que não l’es aconteça
nada!!!
RIO
LIS
Suporto
menos cada dia que passa
Essa
tua indolência de boi castrado
A
roçares-te, impotente
Pelas
ervas e areias das tuas margens.
Com
teu ventre pútrido
De
escamas quase ausentes
E
olhos turvos
Abandonas-te
Para o
encontro sempre marcado
Com a
quase moribunda
Outra
parte da lenda.
Não
tens o direito
Só
porque os poetas te enlearam
Nas
suas odes-feitiços
De
quase insensivelmente deixares morrer
Sem
protesto
Tua
amante.
E sem
protesto também
Para a
morte te encaminhares!
Tens
que acordar para a Vida
Nem
que para tanto tenha de insultar-te !
Em vez
de te entregares ao Mar
De
sexo pendente e abandonado
Terás que
recusar por algum tempo
Esse
regaço de sal
E
vires cá acima
Espumando
de cansaço e raiva
Arrastando
os salgueiros que ainda insistem
Vaidosos
Em
pentear seus verdes cabelos
Mirando-se
no espelho cada vez mais baço
Que
estilhaçará
Como
os frágeis diques
Que
insistem em prender-te
Frágeis
demais para deter tua revolta !
Ressuscitarás
à passagem
Qual
Messias que recusa ser cruxificado ao mar
Tua
companheira de lenda
E
abraçarás teus irmãos de caminhada
Anónimos
Restituindo-lhes
a esperança
De te
encontrarem como vivo irmão !
Se
necessário…pede ajuda ao Mar !!!
APELIDO
Ao fim
de tantos anos de procura
Incessante
noite e dia
Pareceu-me
ter conseguido
Finalmente
Após
uma longa noite de insónia
A
solução para violar
Definitivamente
A
fanática rigidez da composição do meu nome:
Vou passar a nele
incluir
A partir de agora
Homenagem tardia
aminha Mãe
E a minha vontade
também
O
apelido de Caçote !
O
ELEITO
Para
festejar
D’Aubusson
Sua
vitória eleitoral
Fez
uma festa ao contrário,
Os foguetes não subiram
Desceram
!...
SINOS
OU ANJOS
Irei
continuar a não ouvir
Os
sinos das torres
E a
estar atento
Aos
suspiros dos anjos !
DEUSES
E por
que não podemos ser
Um
deus
De que
se possa não gostar ?!
PARTE III
ALVORADA
Vou expulsar de vez
Esta sensação de tristeza de
Fim de tarde cinzento
Vestir meus olhos de cristais de orvalho
Para receber-te alegremente
No vestíbulo da noite
Edificar contigo
Uma alvorada de Alegria !
CANSADO
Despenteei teu cabelo
A escorrer pelas encostas da noite
Mesmo as madeixas de lua prateadas
Procurando tua boca com sabor a rio
Que beijei
Cansado
Ao amanhecer
Com a ternura fresca de meus lábios orvalhados!
SEPARAÇÃO
Ao fim do dia
Cansados
Decidiram inventariar seus bens:
Tinham-se
apenas um ao outro !
Resolveram ali mesmo separar-se !
DE NOITE…AMAR
Quando na rua faço amor
Com a noite
Finjo bater palmas au guarda noturno
Para a manter acordada
Pela
noite fora !
DELIRIO
No apogeu do delírio febril
Esticava-me na noite
Enorme
Tentando chegar ao Sol e
Pôr a roupa a enxugar
De suor frio ensopada
Do outro lado do mundo !...
EMERSÃO
Estou a ressuscitar
Nesta desesperada emersão
De voluntário afogamento
No oceano verde
De teus olhosmulticores !
GRUTA DE FOGO
Deixa.me descer contigo
Essa gruta de fogo
Que ateámos
E onde nos perderemos
Quando nos encontrarmos !
BUSCAR-TE-EI …
Poderás não acreditar
Mas foi este meu último soluço.
Na procura de novas lágrimas
Talvez encontre a razão da alegria !
Buscar-te-ei então
Definitivamente
Ruborizado e trémulo
Como da primeira vez !
TEUS LÁBIOS
Quando a nave cósmica de
Teus lábios de pétala
Poisam nos meus
Despertam
vibrantes
e libertos
hinos de esperança
Todas as orquestras
síncronas
De meu corpo-universo!
POEMA DE JULHO
Existe agora
Esta sensação de queda
No escuro que vem
Com sabor a calafrio
Da raiz de minha incapacidade
De cortar os pulsos
Nas arestas do fogo que acendi
Em Julho
Debaixo de forte bátega de chuva, hoje de lágrimas
Que não deslizam !
IDADE PRIMAVERA
Mal tinha esboçado o gesto de espreguiçar
Um bocejo de sono leve e já vinha pelo ar
A borboleta sem corpo
apenas
asas transparências
Maravilhosamente grandes
A arrastar a manhã colorida
de
luz que meu leito invadiu
Fresco
De lençóis de folhas verdes
De margem de regato e
De idade primavera !
TEU VERBO
E …
No final do longo dia de luta dura
Cai a noite tristeza
Estendendo uma negra asa
Sobre teu corpo exausto.
Apenas sobre o corpo !
Mas …
A serena manhã de sempre
Continua no teu sorriso
Na tua sensibilidade
E no teu verbo.
Que nenhuma
asa negra
De noite
imerecida
Conseguiu alterar !
FLORES DE FEVEREIRO
São raras em Fevereiro
As flores !
Mas
num gesto de magia
Em
11 de aniversário
Sobre
o primeiro bocejo matinal
A
natureza espalhou
Pétalas
brancas aos milhões
Numa
tentativa corajosa
De
mudança do cenário habitual.
Corajosa, simpática tentativa
Mas
frustrada
O acto anterior ainda continuava !
BUSCA NA NOITE
Pelos interstícios da noite cálida
De pirilampos no silêncio
Fui tacteando corpo
que
inventei…
Fresco e perfumado
A emergir das águas do rio
calmo,
sensual…misterioso.
Encontrei apenas
Bruscamente desperto pela dor
Provocada por afiada garra de silva
E sabor a sangue no dedo.
…
Insistirei em procurar-te
Em todas as noites de calor
E pirilampos no ar
Esteja ou não o dedo sarado…
Hei-de encontrar-te a emergir das águas !
ORIGINAL
No teu aniversário
Original
vai ser minha prenda !
Aquela estrela mais brilhante!...
LAGRIMAS
Lágrimas :
Chuva
salgada
Tempero de
alegria e dor
Que não pode
ser
Dos anjos ou das estátuas !
FRUSTRAÇÃO
Grande é agora a frustração
Do meu amigo e vizinho!
Era
apolítico.
A sua politica era o trabalho
Fazia
questão de recordar.
Era também contratado a prazo
Para
além de apolítico.
Na passada semana
O
contrato terminou
E o empregador não o renovou !
DESPEDIDA
Não houve exactamente um adeus !
Mas deixei de ver por momentos
Com
os olhos quase a se afogar
Nas lágrimas que não corriam !
O LAMENTO
Se soubesses poeta Grande
De sensibilidade infinita
O quanto sofro de incapacidade de
Ao menos contigo me parecer,
Certamente desculpa me pedirias!
Mas
ainda bem que não sabes
Enquanto sofro e procuro melhorar
Vou inventando
As
pedras e os musgos cobertos de flores
As
arvores vestidas de frutos
E
de pássaros
Com
a noite infestada de duendes
Que raivosamente afasto com o bico da lapiseira !
PROTESTO CANINO
E o cão ladrava
ladrava furioso
Junto ao pedestal da nova estátua
Aguardando inauguração !
Será que também o cão não gosta do homenageado ?!
Ainda
hoje não tenho a certeza
Se era gato escondido ou
Seria mesmo rejeição canina !
AS SERRAS
As serras
Das
alturas cansadas
Desceram às aldeias e cidades e
Enterraram seus pés
Nas frescas águas dos rios !
OS PLANALTOS
Os planaltos
Ficaram-se
pelo caminho
Já cansados da descida e
Ali adormeceram !
OS DESERTOS
Os desertos
Desistiram
de ser serras
Suados e logo secos
Sob
aquele calor excessivo
Que os incendeia e desidrata!
OS RIOS
Os rios
Procuram-se
uns aos outros
Como loucos irmãos dum mesmo ventre e
Quando
se encontram pensam
Que
voltaram a ser um só
No seio do Universo!
OS MARES
Os mares
Ávidos
insaciáveis de rios
Para abrandar sua sede salgada
Esquecidos que já rios foram e
Berços de Lua que agora os comanda
Perderam
seu mistério de superfície e
Resolveram
que no Verão iriam servir
De
fresca e salgada banheira
À multidão!
E EU
E o que a mim sucedeu
Pequeno
nada
Perdido
no tempo e espaço
A inventar inversões de magnitude universal
E a não ser capaz de mudar a direcção de teu olhar
E o ritmo do teu coração
Apenas perdeu o domínio do seu !
CONSELHEIRA…A NOITE
E a noite desceu
Sobre meus olhos cansados
Do Sol
E da ausência dos teus.
Esperava-a negra e opaca
Ocultando todos os seus
E
meus mistérios.
Foi crescendo…
Quase como se do dia prolongamento
Com seus olhos brilhantes
Grandes…
Deste tamanho…
De que não consigo ver o limite.
E o esperado descanso de meus olhos
Foi um adiado projecto !
A noite nem sempre é boa conselheira
E muitas vezes é ainda
Pior
companheira !
se verá
Se
tenho ou não razão AMANHÃ SE VERÁ
Algo de anormal se passa
Na fluidez do espaço.
De
anormal e desagradável.
Desde a noite passada
Algo começou a decompor-se
Como corpo celular em desagregação.
Ou será apenas invenção
Resultante
De
cansaço?
De
incerteza?
De
fragilidade?
Não ! É ainda cedo para pensar em desilusão…
Amanhã se verá, se tenho ou não razão!
POR ENTRE OS DEDOS
Tentei segurá-la na mão
Que com força fechei
Pensando que a tinha conseguido apanhar
No momento que pareceu passava perto.
Para a ver de mais perto
Ver sua cor
E aspirar seu odor
Fui abrindo a mão devagar…
Muito devagar…
A mão vazia e igual
Desenganou-me na violência:
A
felicidade escapara por entre os dedos !
AO POETA
Ao poeta tudo é permitido
Ao poeta nem tudo é perdoado.
E aqui é que se ordenam ou complicam
E o poeta faz as suas opções
Cómodas ou incómodas.
O poeta pode ser irreverente´
E fá-lo algumas vezes fingindo.
O poeta gesticula e grita
Sem que canse os braços e a voz.
O poeta inventa para si um espaço
Onde nem sequer se consegue encaixar.
O poeta “desencadeia” e guerras “faz”
Só para sentir o prazer de construir a Paz.
O poeta inventa uma flor impar
Mesmo quando não tem a quem a dar.
Do poeta o que me agrada afinal
É o afirmar-se ou negar-se sem que de tal
Faça regra ou ritual !
POETA E POESIA
Provavelmente até terão razão e
Na busca de novos caminhos para a Poesia
Tu não passarás de uma utopia
Saída de minha irreverente (ou interessada ?) invenção.
E esses teus olhos ternos não serão reais
Fazendo parte do conjunto dessa imagem
Que eu fui construindo dessa miragem
Feita só de detalhes virtuais.
Sê-lo-ão do mesmo modo teu ar terno
Que existirá apenas a meus olhos
Esta vida quase só feita de escolhos
É bom estar em teu espaço tão ameno.
És capaz de ser a desilusão
A negação do mito criado
Pela minha frágil invenção.
Desilusão ou não és tu
Ultrapassando largamente qualquer invenção !
MÁQUINA DO TEMPO
Criei a máquina do tempo
Em noites de insónia e cansaço
E nela me sentei para descansar.
Fiz um programa de pormenor para a largada
Em direcção ao futuro contigo de mão dada !
Em verdade o programa falhou
E a máquina nem sequer arrancou!
EM VÃO
Durante anos a fio
E
a frio
Fui vencendo a tentação de procurar
E
encontrar
Um tema constante
E
consistente
Para sobre ele escrever !
Em vão !
Escrevia, quando o fazia
Sobre
o que em cada momento surgia e sentia.
Insignificâncias quase sempre
Por
incapacidade estrutural
Ou
vocacional
Para escrever sobre o transcendente.
E quando escrevia era sempre
Podes
crer
Era para do acto tirar algum prazer.
E tirei-o ! E tiro-o sempre que escrevo!
PEGO NOS TEUS POEMAS
Quando a noite impiedosa
Engole a última réstia de luz
E no calendário imaginário
Que me suplicia sem dó´
Risco mais um dia
Um dia qualquer
Em que permaneci só.
E pelo espaço de meu ser
Destinado a permitir tudo o que é mau
Deixa que nele cresça uma dor aguda
E uma raiva surda
Por não ter a capacidade e a coragem
De me contentar com tua imagem !
Dou comigo a insultar-me intimamente
E a me acusar de ser como todos
Sem algo de especial e diferente !
Então pego nos teus poemas
Que
leio
Releio
E quero que eles sejam tu
E eu deles fazer parte
E só quando forçado a acreditar
Os aceito no seu no seu significado real
Da expressão e sensibilidade feitas Arte !
CORAÇÃO LOUCO
O que será preciso fazer
Ou
não fazer
Para que este louco coração
Pare de me obrigar a sofrer ?
Era bem tempo já
E com mágoa o confesso
De tornar real a frieza
Mas não obtenho sucesso !
E se a ideia mais frequente tem a ver
Com o atraso com que parti
Logo outra se lhe segue e me sossega:
Assim
sofrerás menos tempo
É
assim melhor para ti !
Mas por que hei-de sofrer
Se o que procuro é a felicidade ?!
Resposta não há ! Quem me a dará ?
COMETAS
Do que sobre cosmografia aprendi
E nunca estudei
Foram os cometas que mais gostei !
Ao contrário das estrelas e planetas
Uns das outras dependentes
Os cometas vagueiam pelo universo
Aparentemente livres e sem órbita definida.
Quisera eu na vida ser um cometa !
Afinal descubro que não passo
De um vulgar e sedentário satélite
Mortal e umbilicalmente ligado a este planeta!
E como se isso não bastasse
Entras tu no meu cósmico espaço
Como se do Halley se tratasse e
Em vez de me levares
Na tua viagem louca
Abandonas-me quase sempre
Invariavelmente sem promessas
E um sabor amargo na boca !
TEM CALMA
…mesmo assim sofrendo
Como cachorro acabado de desmamar
Sempre me vou prometendo
E enganando
Tem calma isto há-de mudar !
Mas o quê há-de mudar ?!
Eu ?
Tu ?
Ambos ?
Eu só ?
Tu só ?
A perguntas sem resposta
Como estas
Sendo afinal bem pouco
É tudo quanto me resta !
… será mesmo tudo o que resta ?!
PAUSA POETICA
Durante nosso encontro na gelataria
Confessei-te e é verdade
Que tinha parado com a poesia !
Não por me sentir doente fisicamente
Só que não andava nem ando bem
Psiquicamente.
A poesia de que sou capaz
Que devia ser de horizontes ilimitados
Resume-se por inteiro a ti
Nestes devaneios tresloucados.
Qualquer dia ainda aceito
Para descanso meu e algum cinismo
Que afinal o que me proponho
É a prática do masoquismo !
E isto me assusta, podes crer
Por comigo tal prática nada ter a ver !
CARDOS NO CAMINHO
Eu sei que assim o que faço
É de cardos e silvas encher meu caminho !
E sei que terei de o percorrer
Descaço e nu
Desde que me reste a esperança
De no final estares tu.
Bem mais me foi prometido
E bem menos me foi dado
Custando muito aceitar
Já vou ficando treinado.
Treinado
mas não acomodado !
AMAR-TE
Amar-te
É
o que a cada instante me prometo
Amar-te
É
o que neste momento quero
E
o que amanhã quererei
Amar-te
E
não o fazer em segredo
Quero
amar livremente
Sem
qualquer partícula de medo.
Amar-te
Como
amo a vida, o ar, o Sol e o Mar
Amar-te
Desta
forma simples e franca
Como
a gaivota ama o mar
Amar-te afinal
De
todas as formas
E
as que estão por inventar.
Mas que inventaremos um dia
Tal como o fazemos agora… na Poesia !
TALVEZ UM DIA
E enquanto me não convenço
De que tal possa suceder
Vou registando o que penso
Sobre ti…sobre o amor…até ver !
Até ver por quê ? Até ver o quê ?
Se amar-te é tudo o que quero fazer ?
Amar-te sempre e de todas as formas
Com a ternura que mereces
Com o carinho que tenho
Amar…
Teu pensar privilegiado
Tua sensibilidade incomum
Fundir no teu o corpo meu
Num definitivo abraço e
Dos dois corpos ficar só um !
Amar-te sempre e de todas as formas e
Sermos ambos a definir as normas.
Amar-te ao alvorecer
Com o primeiro raio de Sol
Sobre a relva de um jardim
Ou sobre milhões de pétalas espalhadas
A servirem de lençol !
Amar-te sempre e de todas as formas
Do sol posto ao fim do outro dia
Desde que sintamos prazer e alegria
E que o amor seja sempre companhia.
Para que não seja apenas amor
E seja também Poesia !
Talvez um dia…
Será
um dia !
CORPO ?VERDADE ?
De olhos cansados vou
Teu
corpo inventando !
Em traços largos e breves registo
A suavidade dos contornos
Que mal se notam na planura da tela !
Aparecem
Na extremidade de meus dedos
Duas gotas de cristal que coloco
Uma a uma na “cavidade” orbital.
Mas de repente decido
Por uma questão de dignidade
Desistir de teu corpo inventar
Se ele não corresponde à verdade.
E quem sabe a Verdade de teu Corpo ? Ou do meu ?
OUTRO CORPO ?
Num pedaço de cartão
Os lápis de guache criaram
Caído no chão
Um corpo disforme
Sem mãos sem braços
Sem coração !
Apenas uns pés nus
Espreitando sob um amontoado de trapos
Sem categoria e feitio definidos
Vencem o cinzento do asfalto
E aconselham o silêncio.
Um corpo desenhado e cansado
Está presente nos degraus
Do edifício da vida que o não entendeu !
Nem eu …!
SE CALHAR
A promessa de calor do Verão
Que se perfilava no zénite do teu olhar
Deixou-me um céu com nuvens
Ameaçando futuro incerto
Sem Verão sem Primavera
Se calhar só de Outono e Inverno
Se
calhar Se calhar…
Um Futuro se calhar !
ATÉ VER
Foram sempre os espaços ocupados
Por muita gente e diferente
O meu lugar preferido.
Não em busca de confusão
Nem à procura de ruído
Apenas na multidão podia
Se quisesse ficar escondido !
Esse hábito foi mudando
Está mudando
Até quando? até
quando ?
E agora sem querer
É só que me encontro
Até
ver Até ver !
Só
E até ver
Sem
querer !
ALI, DO LADO DE FORA
23 horas e 30 minutos
Ali
Do lado de fora
Cai a noite sobre corpos
Que se refrescam nas esplanadas
Sobre corpos que se dobram
Sobre as máquinas
A desenhar figuras geométricas
No aço ou no vidro
Corpos que de tão cingidos
É difícil saber se são dois se um só
Bocas que se buscam ardentemente e
Mãos que inventam poemas
Nas pontas dos dedos trauteando
Melodias de amor
No percurso dos corpos
De fim de Junho
Nem todos estão perfumados e
O perfume é-lhes transmitido pelo amor.
Mesmo que dure só até final de Junho !
Ou até ao fim da noite !...
FIM DE JUNHO
Por que seria amarga a
Última amêndoa que restava !?
Por que seria triste
Meu último olhar !?
Por que só agora
Mais que ontem
Neste final de noite de Junho
Onde nem sequer o calor tem a
Coragem de ser real ?!
Por que este final de Junho
Há-de ser de coragem irreal
E a última amêndoa que me restava
Tinha um sabor amargo
Anormal
?!
PROMESSA
Prometera há pouco não escrever mais hoje.
A meia noite vinha e vem aí
Por isso eu prometi.
Eis que de repente
Sem qualquer razão aparente
Desvio os olhos do livro que estava a ler
E olhei em volta :
Quarto razoavelmente iluminado
Móveis
quase inexistentes
Duas
cadeiras de fórmica e pés tubulares
E
por aí espalhados livros
Por
ler e já lidos
Um
saco de recordações
Uma
esteira de palha
Um
quadro mal pintado
Na
técnica a que alguém chama gestual
E eu sentado no colchão
Assente directamente no chão
Vestindo apenas o relógio
E de bloco e lapiseira na mão:
Serei
uma visão erótica ou de evidente solidão ?!
FOTOGRAFIA
… e por que hei-de admitir
Só por que é real
Que a noite lá fora
Está escura e fria
E não poderá estar
Se eu decidir pensar
Que a noite está bestial
E com um brilho como se fosse dia ?!
Quem me impedirá de
um dia
Da altura deste 2º andar
Se decidir à noite
alterar
Sua real fisionomia ?!
Aí está o que é impossível
Ao fotógrafo fazer !
Mesmo usando os mais sofisticados materiais:
Alterar
à noite fotografada
As
suas cores reais !
Será por isso que um dia deixei a fotografia ?!
AINDA O SONHO
E ao meu sonho subo
Correndo
Pela espiral do meu grito
Para do ponto mais alto
Ver teus olhos de afago
E então acordar
…serenamente
!
SÃO DE INSÓNIA
São de insónia a quase totalidade das noites
Que tristemente recordo.
São de insónia os vincos que rodeiam meus olhos
De raiva incendiados.
São de insónia meus passos incertos
Pelas manhãs mal acordadas
São de insónia e de revolta
Estas pertinazes incapacidades de
Violar o jardim mais próximo
E
Ao alvorecer apanhar a rosa
Ainda quase em botão
Orvalhadae
A colocar entre os cabelos !
OUTRO OU O MESMO
E o sonho persistindo
Pela noite e madrugada
Colocou sempre nos meus olhos
Teu rosto que me sorria
E teus braços que se abriam… esperando-me.
Acordei sem alma e
Sem corpo sensível
E à minha frente apenas
Uma mistura incompleta
De várias tintas
Que não fugiram do caixilho !
De ti só o sonho resta !...
EU SEI QUE
Eu sei que não devo construir
Ilusões injustificadas.
Eu sei que talvez nem mereça sequer
Uma réstia de esperança.
Eu sei que
Eu sei que
Eu sei que
Mas sei também que
Me não deve ser negado o direito
De aspirar a ser feliz!
BREVE ADEUS
Durante todo o tempo
Que o debate durou consegui
Sem esforço
Assistir e atentarão que se passava
E simultaneamente construir
Com menos esforço ainda
Um castelo de cristal
Que sobrava de teus olhos
E contigo nele couberam
Dentro dos meus
Adquirindo um novo brilho.
Mas um breve adeus te levou
E o castelo de cristal não passou
De duas lágrimas
A
rolarem pelas faces !
É NESTAS NOITES
É nestas noites de solidão
Com o vento em espasmos de espaço e
A chuva em orgias de charcoe
O ribombar dos obuses cósmicos em delírios de ruido e luz
São os meus companheiros
Que me trazem sobressaltos
Que me trazem sobressaltos !
É nestas noites de afecto desnudadas
Que me tentam a tudo renegar
E a elas dedicar
Incondicionado
Este tempo excessivo!
É nestas noites de frio
Que insisto em interrogar teus olhos
De conformada tristeza
E na falta de resposta
Acabo por deparar com os meus
Reflectidos no espelho !
O ABRIL
Partilhámos este ano
Enfim
O Abril-Abril
E o das Águas Mil.
Debaixo de chuva intensa
E de chapéu partilhado
Construo de Abril novas promessas
Que os teus olhos afirmaram!
BECOS DA NOITE
Insiste a noite em criar
Artificiais becos
Para esmorecerem minha vontade
De chegar onde tu estás.
Em vão …!
Mesmo às escuras
Nas noites de becos artificiais
Teus olhos orientam meus passos
Sem erros me conduzem a ti.
O espaço não conta nas noites
De becos inventados
!
MEU GRITO
Na esperança acrescida
De me fazer ouvir
Aqui fica escrito
Em decibéis de silêncio
O meu grito.
A esperança que deposito
Neste meu grito escrito
Há-de superar em eficiência
O que lhe falta em ciência !
É sempre a ciência
Que resista a tua ausência.
Mas ao desejo de ter-te junta a mim
Não há dificuldade que impeça.
Em poesia tudo é possível : inventando!
E há quem garanta que no amor também.
Eu não acredito
Daí
o meu grito… Escrito !
SEM NOME, OU…
… não leriamos os mesmos autores, não seríamos capazes
De libertar o pensamento
E deixá-lo
Nas
noites sem lua
Estampar-se à velocidade da luz
Contra a esquina do prédio do fim da rua!
E de cauda entre as pernas
Regressar
Para de novo disparar
Iluminado o caminho
Pela luz esverdeada
Que emana do teu olhar.
Em busca, ao que diz,
Da forma que entenda ser Feliz !
SE INSITEM
… se insistirem que a nossa comunicação se faça através de
tua parte louca de poeta…vamos em frente
de
mãos dadas pelas avenidas
atapetadas
de folhas de Outono
douradas
cansadas
de sol e de luz.
E assim pelas mãos ligados
E pela sensibilidade
Já longe da cidade e em direcção ao mar
Criaremos novos poemas
Que atiraremos ao ar
Para quem os quiser apanhar.
E à beira-mar
Se o tempo aconselhar
Mergulharemos nas águas salgadas
E poder assim contemplar assim
Teus olhos verdes de rio
E teu corpo a emergir do azul
Num justo vestido branco…
De
cetim…!!!
OS TEUS OLHOS…
Estive já
Por dentro dos teus olhos
Que sorriam.
É interessanteeste reflexo
De espelho
Em que os teus olhos estão
Fora e dentro dos meus.
E já tentei também
Sem resultado que se notasse
Meter-me por dentro do teu pensamento.
Impenetrável aos meus apelos
Não respondeu.
Por isso busco os teus olhos
Mesmo quando os escondes
Atrás de cortinas de vidro !
COURAÇÃO !
Durante todo o dia
Em meus olhos acumulei
Os mais brilhantes raios de Sol.
E como projectores
Teus passos acompanharam
Desde o primeiro degrau do centro comercial
Até à mesa circular onde te aguardava.
Temendo que o coração
Do seu lugar habitual
E atrás dele tivesse de correr
E o repor
No espaço que parecia recusar.
Não saltou para a esplanada… e fez mal
Acompanha-me
agora
Na
noite
Mais
só… mais noite !
Hás-de habituar-te, coração !
Amar
nem sempre é dia !
Aprende ou então vira COURAÇÃO !
A LEITURA
É quase sempre com prazer
E um misto de expectativa
Que inicio a aventura da tua viagem.
Por vezes me impões um ritmo acelerado
Outras me recomendas calma concentração
Como se numa viagem de comboio a
Variedade geográfica fosse de relevo leve
Ou então se espraiasse por longa planície
Onde a viagem parece não ter fim.
Rindo até às lágrimas tantas vezes te percorro
Meditando me envolves tantas outras
Apresentando-me a amigos que desconhecia
Também a inimigos que não esperava !
Rápida e lentamente te percorri
Convivendo com gentes em tão diversos lugares
Que pelo caminho me apresentaste.
Cheguei ao fim da viagem
E uma grande tristeza me invade:
Fechar
um livro é como bater com a porta
Na
cara dos amigos que me apresentaste
E com quem deixei de conviver!
POESIA DA NOITE
Nesta noite de quente magia
Com a Lua a espreitar no pinhal
Transformo-me na brisa suave
Que entreabre a janela de teu quarto
Onde dormes um sono calmo e natural.
Na penumbra de teu quarto
Onde transformado em brisa eu entrei
Existe um poema adormecido
Coberto pela transparência do lençol
Que eu brisa leve …levemente
Vou descobrindo e refrescando.
Extasiada a brisa olha o poema
Transformado no teu corpo
Que calmamente respira
Afagado pela brisa
Que decide não fazer ruido
E não deixar o teu quarto
Fresco
o quarto do poema-corpo !
POEMA INCOMPLETO
Há um poema incompleto
No interior de meu ser
Poema que algum dia serei capaz de escrever.
Um poema desesperado
Cortina incapaz de separar
A ilusão mais deslumbrante
Do futuro triste e solitário.
Há um poema incompleto
Que gostaria de terminar
Ou então passar
De poema na mão
A cortina entre a ilusão e a desilusão
Com o poema incompleto na mão!
ESCREVER, ESCREVER
Estranhei atá agora
Como era possível num só dia
Desencadear uma tão vasta onda
de poesia !
E isso mesmo afirmei
Penso que mais que uma vez.
Se fosse hoje
A tal não me atreveria
Pois a sensação que tenho é
Se quisesse
De escrever não pararia !
Isto não só com poesia tem a ver
Mas sim escrever
escreverescrever !
APENAS EU
Mas que culpa podes ter ?!
Se um culpado tem que haver
Serei apenas eu
Podes crer !
Eu
Apenas eu
Poderia ser apontado
Por o teu calmo viver
Sem querer
Te ter desviado !
É este receio que até ver
Me poderá fazer sofrer !
ME DISPERSO
Passam as horase
Meu corpo está cansado
Do
calor
Da
solidão
Da
falta do que não tive
O calor de tua mão.
Muda o dia no calendário
E eu continuo
Continuo sempre
A desejar o contrário !
E assim me disperso
Pelo espaço de teu ser
Que a meu ver
É
todo o Universo!
SUAVEMENTE
Suavemente
Minhas trémulas mãos
Tocam teus olhos
Que insistem em fixar o chão
Como se do chão emergisse a força
Dos poemas que a distância te inspira!
Dizes que as palavras
Vindas de um planeta distante
Que sabes existir
Sem nome e se calhar sem vida
Dele apenas percorrem o espaço
As palavras que em vida foram ditas
E que tu
Mágica antena
As capta e regista em caracteres terrenos.
Mas seria muito alegre a vida
Nesse distante planeta
Pelos registos que aí ficam !..
A
menos que a tradução seja imperfeita !
EM CAUSA
Aqui nego meus mestres
De história e de geografia
Desta altura e sem vertigens
E sem glória
Que vou subindo
e descendo
quer de noite quer de dia.
O primeiro me ensinou
Que mais isto a mais aquilo
Foram feitos por A e por B
E dava-se por satisfeito
Depois vivendo tranquilo !
O segundo estava cansado e desanimado !
E o que eu e todos nós fizemos ?
E o que deixámos por fazer ?
Quem o irá ensinar e
Quem o irá aprender ?
Sim
Digam-me lá
Mestres da história e da geografia
Da matemática e da filosofia ?
Dizem hoje ou qualquer dia ?!
PARAR DE PINTAR…NÃO
E onde estará o mal
De que alguém como eu
Incapaz de copiar
Este ou outro plano natural
Decida pegar em qualquer objecto
Encharca-lo violentamente num caco de tinta
E sem qualquer regra definida
Inventar ou criar
Novos planos ou plano algum
E chamar-lhe depois a arte de pintura gestual !
Criar o que já foi criado
Éato que me não seduz
Depressa fico cansado!
Se quiserdes e vos der satisfação
Não lhe chamem coisa alguma…
Eu
Volto na mesma às tintas
Agora noutra dimensão!
Parar…?...só quando me cansar !
ESCREVER AO SOM…
Escrever ao som da orquestra de balet do Canadá
É certamente ato que
Não mais se repetirá !
Por isso aproveitei
Experimentei e gostei.
Penso até
Se nova oportunidade surgir
A experiência voltarei a repetir .
Seja ela a do Canadá , da China ou do Japão
Pois me pareceu que a rescrita
Ganha uma diferente dimensão !
E um ritmo diferente por que não
É o que me
Acrediteis
ou não !o que me parece
SOBRE TI
Vinha de algum tempo a prometer
Que aos poucos e com pesar
Sobre ti deixaria de escrever.
Com alguma dificuldade Confesso
Cá vou cumprindo a promessa
Que não raramente esqueço
E sobre ti escrever recomeço.
Passa tão subtilmente do pensar ao agir
Quase me convencendo
Que a mim mesmo estou a mentir !
Devia ficar chateado
Mas prefiro levar isto a rir !
Um dia será sério ! Um dia…mas quando ?
POESIA INCOMPLETA
Andava de há muito recordar
O titulo da obra de
Mário Dionísio:
POESIA
INCOMPLETA
Agora chegado ao termo da leitura
E me certifiquei que era mesmo o fim
Compreendi o porquê do título!...
Incompleta para ele
E sobretudo para mim !
O que é bom não devia ter FIM !
RECEIO
Há pouco o espelho
Devolveu-me a imagem
De alguém que não era eu!
Olhos encovados
De negro circundados
Vestígios da noite passada
Em que pouco dormi
Para não dizer que foi nada.
Os gestos são pouco firmes
As ideias inconsistentes
Um frio que vem de dentro
E arrepios me provoca
Nesta manhã quente de Junho.
E não é uma sensação de fracasso
A que o sono me vai roubando:
O
que na verdade receio
É
que amanhã encare tudo
Com
natural insensibilidade !
Não é receio ! É medo
!
VALSA INVENTADA
Deixa-me esgueirar contigo
Nos acordes desta valsa inventada
Para os jardins de Inverno
Deste palácio de Verão
Que é a noite redonda e calada
Ponteada de diamantes longínquos
Que emitem um nervoso brilho
Neste sussurro de asa de mamífero
E de lábios que suavemente percorrem
A pele queimada
Deixando marcas que se prolongam
Pela madrugada insone
Marcas que acalmam e são
Promessas de outras
Que todos os amanheceres
Insistem em querer apagar !
NÃO RENDER
Perder a noção do tempo
É quanto procuro conseguir.
Há quem o faça bebendo
Ou fugindo
Ou morrendo !
Eu
Por enquanto
Ler pintar ou escrever
É quanto me vai bastando
e
espero tão cedo
não me render !
DESPINTAR
Libertarei todas as minhas aves-pensamentos
Todos os meus gritos silenciados
Todas as cores singelas
Ou misturadas.
Lançá-los-ei no ar aos ventos
Nos ouvidos impreparados
E nos matizes de alvoradas
E poentes
Meus gestos bruscos ou moderados
Em misturas de branco
Amarelo
Verde
Vermelho
Preto
E
todas as outras
Ficarão por algum tempo na tela registados.
Pelo menos o tempo de os olhar
Apreciar
e…
Alterar !!!
PROMESSA
E daquela ausência de gosto
Pelo que pintei e escrevi
Me fui apercebendo e
Porque a contragosto
Continuar não era capaz
Assim vai tudo esmorecendo
Acompanhado de algum desgosto
Vou enfim voltar à paz !
Prometendo voltar outro dia
Ou outra noite…Verás !
ATÉ DO QUE ESCREVI
Para usar de muita franqueza
Penso que nunca gostei
Do que pintei ou desenhei !
E até do que escrevo.
Se em qualquer dos o fiz
Umas vezes era por estar triste
Outras por me sentir feliz.
E aí terá ficado
Um ou mais registos de cada estado
Ou um borrão mal pintado
Ou então
De lapiseira na mão
Em letras de amor ou raiva
Fui registando cada emoção.
Ah ! … todas, todas Não
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E POR
FIM
E por
fim
Cansado
De
tudo de ti para mim conservar
Verifico
com alegria e tristeza
Num
mesmo espaço-tempo
Que
teu destino
Como o
infinito
É ser
isso mesmo
Albergar tudo
O bem e o mal
Infinitamente
grande
A prometer
sempre
E
nunca se dar
Para ser livre e diferente
?!
Reis Caçote
https://youtu.be/J4Hy3ejMxk8?t=25
https://youtu.be/J4Hy3ejMxk8?t=25
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